O post de hoje da coluna Papo de Mãe traz um relato super interessante e emocionante da nossa colunista Nathália Alves sobre como ensinar seu filho a valorizar o dinheiro, onde ela relata sua experiência com sua filha e sua primeira compra usando as moedinhas de seu confrinho. Está super gostosa a leitura e nos leva a refletir muito sobre educação financeira para os pequenos.
A primeira experiência concreta que minha filha teve com dinheiro foi aos oito anos. Estimulando a pequena a economizar e a vivenciar as contas de Matemática aprendidas na escola, minha família começou a fazer doação de moedas, que ela guardava num porquinho de pelúcia cor-de-rosa pra lá de escandaloso: cada vez que recebia um depósito, ele tocava uma música tão animada quanto estridente. Até que um dia ela me perguntou:
– Quando eu vou poder usar o meu dinheiro?
– Quando você souber o que quer comprar. Já sabe?
– Já!
– E tem no supermercado o que você quer?
– Tem! – fazendo certo suspense.
Alguns dias depois, antes de irmos ao mercado, abrimos o cofrinho tirando as moedas através de uma tampa. A felicidade estampava seu rostinho e a ansiedade era evidente. O treino da Matemática começou ali quando ela separou as moedas em ordem de valor até descobrir o montante da sua poupancinha.
Chegando ao destino, ela acelerou o passo como quem sabia mesmo o que queria:
– E então, filha, quantos reais você tem mesmo?
– Treze.
– Certo. E onde está o que você quer?
– Ali! – apontando o corredor de doces e seguindo em disparada.
Fiquei de longe apenas observando. Não demorou 2 minutos para que ela apontasse para uma pequena caixa de chocolates que trazia como “brinde” uma vistosa bolsa da Hello Kitty:
– Eu quero aquela ali! – feliz da vida.
– E quanto ela custa?
– Vinte e três.
– E você tem?
– Não…
Confesso que me deu um nó na garganta ao ver a decepção. Minha vontade era sugerir que ela esquecesse tudo aquilo, deixar a lição pra outro dia e comprar logo o que ela desejava, mas eu simplesmente não podia. Assim, ela rapidamente entendeu a “regra do jogo” e passou a excluir da sua seleção tudo acima de treze reais. Doeu muito em mim, mesmo assim, me mantive firme.
Incentivei que ela olhasse tudo com calma, o que ela fez várias vezes. Finalmente focou nas tradicionais caixas de bombons sortidos. Foi descendo os olhinhos prateleira abaixo até descobrir a mais popular de todas:
– Essa aqui é cinco. Vou levar esta. E dá pra família toda, né?
Engoli seco e quis saber:
– Vai levar mais alguma coisa?
Ela foi generosa em sua primeira compra se lembrando de levar um pequeno pacote de balas para a irmã caçula, que estava em casa.
Partimos em direção ao caixa. Na fila, havia apenas uma pessoa terminando de passar a sua compra. Enquanto isso, a pequena consumidora analisava todas as ofertas das tentadoras gôndolas. Pegou um gibi da Turma da Mônica dizendo:
– Eu quero esse gibi também.
– Tá bom. Quanto é?
– Três.
– Quanto você já gastou com o chocolate e a bala?
– Sete.
– Se você comprar o gibi, com quanto vai ficar?
– Três.
– Muito bem! Essa é a conta!
Não abri a minha boca, esperando a reação dela que foi, espontaneamente, a seguinte:
– Pensando bem, tem tanto gibi em casa, né, mamãe?
– É…
– E também se a gente quiser mais a gente pode ir lá naquela biblioteca pegar emprestado, né?
– É…
Lembrei na hora de um ensinamento do meu pai: “Evite as compras por impulso. Tente comprar somente aquilo de que precisa.” Não sei bem como – afinal eu ainda não havia tido oportunidade de explicar isso a ela – mas era o que havia acabado de acontecer. E voltamos a nos concentrar na fila.
Percebi nela certa tensão ao olhar fixamente para a cédula que a pessoa à nossa frente entregava à moça do caixa. Imaginei que ela estivesse receosa com a sua forma de pagamento e tentei tranquilizá-la:
– Moeda é dinheiro também, filha. Aliás, a moça vai gostar muito que você tenha trazido moedas, assim ela vai ter mais troco na gaveta com a sua ajuda.
Não sei se ela acreditou de imediato, mas dito e feito: a senhora do caixa, que ouvira minha defesa aos trocados, tratou de fazer uma enorme festa com o recebimento das redondinhas, lançando olhar cúmplice para mim e colaborando com o fechamento deste importante momento.
Chegando em casa, a primeira coisa que fez foi correr até a irmã:
– Olha o que eu comprei pra você! Fui eu que escolhi, sabia? – toda orgulhosa. E eu mais ainda.
Depois degustou, realizada, alguns chocolates da caixa de bombons que comprou com seu “próprio suor” e “para toda a família”.
Lutei contra meu instinto materno para não me render dias depois a tal bolsa da Hello Kitty. Caso contrário, o que eu estaria ensinando a ela? Essa bendita bolsa – um brinquedo intruso no corredor dos doces – ficou gravada na minha memória, espero que só na minha.
Hoje, dez anos depois, acompanho a poupança que ela faz junto com o namorado, para uma viagem que pretendem fazer no futuro. A irmã, que também teve cedo a mesma experiência, recentemente levou meses juntando uma grana para comprar um Iphone.
A vida não é fácil, dinheiro não dá em árvore, mas pode ser uma coisa muito boa se for valorizado como deve e aplicado naquilo que é importante. Quanto mais cedo as crianças aprenderem essa lição, melhor para nós. E mais ainda para elas.
Nathália Alves é publicitária, pesquisadora de mercado há 16 anos, mãe de duas adolescentes e autora do Instagram @repertoriodemae.
Educar os pequenos a cuidar e principalmente a pensar sobre o dinheiro é uma lição importantíssima da vida. Uma das mais importantes acredito. Belo texto.